My thoughts05 May 2010 12:08 am

Porque o passado não passa. Parece que foi há muitas e muitas décadas. Um amontoado de acontecimentos e dores vão dificultando a visão e às vezes até parece que as coisas nem aconteceram. A idade vai se assomando. A maturidade exige postura e se tenta atender às demandas da vida adulta. Novos amigos, um grande amor, um casamento e tudo parece que vai durar para sempre.

Um dia, o casamento acabada, o amor se vai, amores muito mais profundos nos deixam estupidamente, num acidente…Muda-se de país, de idioma, de amigos, de “aires”. A memória é seletiva, parcialmente “deleta” dados. Há um excesso de informação que parece prejudicar a manutenção dos arquivos. Buscam-se novos prazeres, novos tons, texturas e temperaturas. Elimina-se o contato com a memória e saudade é palavra para ser apenas explicada, ensinada, deixa de ser sentimento. Mas o passado não passa. O beija-flor tatutado no braço continua lá. A pele, o músculo, a visão, todos os sentidos têm memória.

Dei voltas e voltas. Abandonei e fui abandonada, me perdi para voltar a me encontrar nas coisas mais básicas. Nas unhas roídas, nas noites insones, na rocha dura de uma montanha, na foto do pôr-do-sol que vivi tantas vezes. Na busca do risco, no esforço do corpo, no cansaço do trabalho, na música que havia apagado, nos nomes que havia esquecido. É preciso percorrer muitos quilômetros para chegar ao mesmo lugar, para se deparar com o inevitável.

Quando pensei que havia vazio, descubri imensidão de experiências. Quando pensei que era tempo de recolhimento, o passado reapareceu. Uma porta que se reabre, um nó que se reata, um impulso mais forte que a razão. O que quero hoje é simplesmente o que aprendi a amar no passado. Parei de lutar contra mim mesma, me entrego ao que sou. O beija-flor continua tatuado.

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